Nos últimos tempos, o Ministério Público de São Paulo tem sido chamado a participar de forma mais efetiva do debate acerca da efetivação dos direitos das comunidades remanescentes de quilombos.
O tema não é novo. Contudo, recentemente e de forma paulatina, vem ganhando espaço na sociedade, seja por força da mobilização dos quilombolas, seja porque o tema tornou-se objeto de diferentes diplomas legislativos e, em consequência, ocupa a agenda de diversas instituições públicas.
É necessário, portanto, que o Ministério Público também volte a sua atenção para a temática e dê condições e estrutura aos seus Membros e Servidores para que sejam devidamente cumpridas as suas atribuições constitucionais e legais.
Marcos legislativos
A Constituição de 1988 constitui um marco legal primordial no reconhecimento de direitos às comunidades remanescentes de quilombos.
De início, é preciso registrar que o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, em seu art. 68, trata especificamente da questão, ao dispor: “Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”.
Embora tal dispositivo seja o mais marcante e invocado quando se trata dos direitos das comunidades quilombolas, outros dispositivos constitucionais também merecem destaque sobre a matéria.
Ao cuidar da cultura nacional, a Constituição da República, em seus arts. 215 e 216, igualmente contempla direitos relacionados a tais comunidades descendentes de afrobrasileiros, estabelecendo que o Estado protegerá as suas manifestações culturais e, em especial, no art. 216, § 5º, afirmando que ficam tombados todos os documentos e os sítios detentores de reminiscências históricas de antigos quilombos.
Posto o marco legal e a partir da articulação dos movimentos sociais, sobrevieram inúmeros diplomas legais que versam sobre direitos das comunidades remanescentes de quilombos, cujo conhecimento é imprescindível para o Ministério Público.
De plano e em razão de sua relevância, importa citar o Decreto nº 4.887/031 , porque o referido ato normativo, em seu art. 2º, define comunidades remanescentes dos quilombos como sendo os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida.
O Decreto nº 4.887/03, consoante será melhor explicado adiante, é o diploma que regulamenta, no âmbito federal, o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos.
Em seguida, importa citar a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, que veio promulgada por meio do Decreto Federal nº 5.051/2004 e cuidou dos povos indígenas e tribais, aplicando-se, por conseguinte, aos quilombolas.
Na sequência, sobreveio o Decreto Federal nº 6.040/07, que instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.
Anos depois, a Lei nº 12.288/10 instituiu o Estatuto da Igualdade Racial, cujo objetivo é garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.
O Estatuto da Igualdade Racial traz normas específicas para a tutela dos direitos dos membros das comunidades remanescentes de quilombos, dentre os quais os relacionados a saúde, saneamento básico, segurança alimentar e nutricional, cultura e acesso à terra (art. 8º, par. único; art. 17; art. 18; art. 31; art. 32; art. 33 e art. 34).
Fonte: MPSP