Pesquisa revela milhares de variantes genéticas em pessoas com experiência mediúnica, ligadas ao sistema sensorial, imunológico e à glândula pineal
Uma pesquisa coordenada pela Universidade de São Paulo (USP) identificou alterações genéticas em pessoas que se consideram médiuns. Segundo os cientistas, essas mutações podem, supostamente, permitir que esses indivíduos percebam aspectos da realidade que não são acessíveis à maioria da população.
O levantamento, realizado entre abril de 2020 e abril de 2021, encontrou 15.669 variantes genéticas exclusivamente em médiuns, com potencial de impactar a função de 7.269 genes. Para comparação, foram analisados também os genes de parentes próximos dos médiuns, ou seja, pessoas com similaridade genética e sociocultural, mas que não apresentavam habilidades mediúnicas.
Critérios de seleção e metodologia
Ao todo, o estudo envolveu 119 participantes:
- 54 médiuns, com mais de 10 anos de prática, que realizavam atividades mediúnicas ao menos uma vez por semana e sem fins lucrativos;
- 53 indivíduos do grupo controle, compostos por parentes de primeiro grau desses médiuns, sem mediunidade;
- 12 médiuns adicionais, para amostra de validação dos resultados.
Além disso, o estudo incluiu um trio de irmãos, sendo dois gêmeos idênticos médiuns, comparados com o terceiro irmão que não é médium.
Para localizar os participantes, os pesquisadores montaram uma rede de capacitação com alcance nacional, focando em médiuns que desempenhavam papéis relevantes em grupos religiosos com prática regular de atividades mediúnicas, como no espiritismo e na umbanda.
Colaboração e análise científica
Além da USP, participaram da pesquisa profissionais da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Segundo Alexander Moreira-Almeida, coautor do estudo e diretor do Núcleo de Pesquisas em Espiritualidade e Saúde da UFJF, a maioria das alterações foi identificada em genes ligados ao sistema sensorial e imunológico.
“Os sistemas sensorial e imunológico se relacionam a como nosso corpo lida com o ambiente externo. Provavelmente estamos descrevendo funções desses genes que nunca foram ditas antes porque os genes estão geralmente ligados a várias funções”, explica Moreira-Almeida.
Estudo de caso-controle e coleta de dados
“É um estudo caso-controle: você pega casos de pessoas que têm variável de interesse, no nosso caso a experiência mediúnica, e compara com pessoas que são muito parecidas, mas que não têm a variável de interesse — no caso, não são médiuns. A ideia é ver se o grupo [de médiuns] tem algumas variantes genéticas que não estão presentes no grupo controle. Esse é um modo padrão de se fazer estudos de genéticas”, afirma Moreira-Almeida.
Os participantes forneceram amostras de saliva para extração e sequenciamento do DNA, além de preencherem questionários sobre qualidade de vida e experiências mediúnicas.
Experiências relatadas
Entre os 54 médiuns do grupo principal:
- 92,7% relataram falar sob influência de espíritos;
- 70,9% disseram se comunicar por escrito;
- 52,7% afirmaram ter visto espíritos;
- 50,9% relataram ter entrado em incorporação;
- 47,3% disseram ter tido experiência fora do corpo;
- 34% relataram ter habilidades de cura.
Confirmações em médiuns independentes
Após a comparação entre os 54 médiuns e seus parentes, os pesquisadores analisaram os 12 médiuns independentes:
- Em 11 deles, foram encontradas as mesmas variantes genéticas do grupo principal, totalizando 1.574 mutações em 834 genes.
No caso dos gêmeos idênticos médiuns, a análise revelou:
- 434 mutações em 230 genes presentes nos dois irmãos médiuns, mas ausentes no terceiro irmão não médium.
Localização das alterações e papel da glândula pineal
Os genes alterados foram localizados principalmente em:
- Sistema imune e inflamatório;
- Tecidos epiteliais;
- Glândula pineal.
Essas regiões foram sequenciadas e analisadas por softwares especializados. Em relação à pineal, Moreira-Almeida explica:
“A glândula pineal fica no centro do cérebro. Até há algumas décadas, se achava que ela não tinha funções significativas, mas hoje sabemos que tem relação com diversas funções do nosso corpo, inclusive com o sono. Diversas tradições espirituais dizem que a pineal se relaciona a percepções espirituais”, afirma.
Conclusão: predisposição biológica?
Os pesquisadores apontam que os médiuns analisados podem ter uma predisposição biológica que influencia como as informações do mundo externo são percebidas. Essa característica os diferenciaria de pessoas sem tais mutações, possibilitando o acesso a percepções incomuns à maioria.
Por Leila Pizzotti
Com informações USP