Os momentos depois de uma demissão trazem muitas dúvidas: foi minha culpa? Não sou bom o suficiente? Poderia ter mudado algo? Uma das angustiantes, no entanto, fala do futuro: o que fazer agora?
Quem está desempregado pensa se deve voltar a estudar – fazer um mestrado, por exemplo -, mudar de área, abrir um negócio ou aceitar uma vaga que pague menos.
A BBC Brasil consultou especialistas em carreira para analisar cada uma dessas questões e apontar o que é preciso considerar antes de tomar uma decisão.
Segundo os entrevistados, ao escolher qualquer caminho, é preciso deixar de lado o desespero e refletir sobre suas habilidades, defeitos e desejos, além das necessidades do mercado. Quais são suas qualidades? No que deve melhorar? E do que o mercado precisa hoje?
“A primeira coisa é se convencer de que é uma situação passageira. Aproveite esse momento para pensar na sua carreira. Se está desempregado, foi algo conjuntural ou pessoal? Como tem sido sua trajetória até aqui? Você precisa se entender”, diz Márcia Damia, administradora e vice-coordenadora do Escritório de Desenvolvimento de Carreiras da USP.
Para isso, dizem os especialistas, vale colocar tudo no papel, buscar livros sobre o assunto e até fazer testes de aptidão na internet. Procurar ajuda profissional é outra opção.
Planejar as finanças também é necessário, para saber se o dinheiro guardado permite arriscar ou exige um novo emprego rápido.
Leia abaixo as dicas dos entrevistados para quatro possibilidades que passam pela cabeça de quem foi demitido.
Voltar a estudar?
Vou estudar exatamente para quê? Antes de investir na formação, quem perdeu o emprego deve se fazer essa pergunta, diz o professor de Economia da PUC-SP Leonardo Trevisan.
Ele explica que cada curso vai dar um retorno diferente e é preciso alinhá-los com os seus objetivos.
O mestrado, por exemplo, tem uma finalidade mais acadêmica. Ele é indicado para pessoas que querem pesquisar uma área do conhecimento ou que têm aspirações docentes.
Já as especializações e MBAs são voltados para o mercado e podem trazer bons contatos profissionais.
“Um mestrado não é melhor nem pior que os outros. Não há uma única receita para todos”, diz Trevisan.
Além disso, não adianta um desempregado estudar um tema que considera importante, mas que odeia, ou que não vai usar, diz a administradora Marcia Dama, do Escritório de Desenvolvimento de Carreiras da USP. “Deve-se pensar: o mercado está precisando disso? No que vai me ajudar?”
Para quem não tem ensino superior, o professor Joel Dutra, Coordenador do Programa de Estudos em Gestão de Pessoas da FIA (Fundação Instituto de Administração), sugere cursos técnicos. Ele explica que, sem faculdade, é difícil alguém entrar em outro ramo de atividade, então precisa melhorar no seu.
No entanto, a decisão de se dedicar apenas aos estudos exige cuidado, diz Leonardo Trevisan. Ficar fora do mercado pode ser prejudicial.
“Se invisto só na educação, quando o mercado reaquecer, vou estar fora dele. Preciso me perguntar: o setor para o qual estou me preparando vai pedir (no futuro) mais gente bem formada ou com experiência?”
Os especialistas lembram que mestrados e especializações não são as únicas alternativas: cursos curtos (e gratuitos) e até trabalhos voluntários podem oferecer novas habilidades.
Mudar de carreira?
Se trocar de emprego é como mudar de roupa, escolher outra carreira é mudar de pele.
A analogia do professor Leonardo Trevisan, do departamento de Economia da PUC-SP, serve para mostrar que entrar numa área completamente nova é uma decisão complexa. É preciso começar do zero e há efeitos na vida pessoal.
Portanto, antes de mudar, saiba se o setor desejado está indo bem.
“Se alguém me disser que quer trabalhar com petróleo, vou dizer: ‘meu filho, olha o preço do barril’. É inviável, não importa o quanto você goste.”
Para fazer a transição, o professor Joel Cunha, da FIA, diz que o melhor é apostar numa especialização. Começar outra faculdade não seria a escolha mais inteligente.
“Não vejo o mercado valorizando duas graduações.”
Ele dá um exemplo: alguém que se formou em bioquímica e não encontra emprego, pode fazer uma pós-graduação em administração e buscar emprego no setor farmacêutico. Assim, não desperdiça o conhecimento que já tem e abre mais portas.
Apesar da dica, Cunha desaconselha mudanças de carreira durante a crise. Na recessão, diz, a lógica da empresa é contratar pessoas que se estejam o mais próximo de suas necessidades. Ou seja, com a formação e experiências ideais. Não seria boa hora para novatos.
Abrir o próprio negócio?
Gostar de cozinhar ou não querer ter um chefe não são, por si só, bons motivos para abrir um restaurante.
Em vez disso, alguém que queira começar seu próprio negócio deve gostar de resolver problemas, estar disposto a estudar empreendedorismo e não ter vergonha de fazer contatos.
“É preciso perguntar que tipo de problema esse restaurante vai resolver para o meu público. Vai ser uma alimentação rápida para quem trabalha na região?”, exemplifica o professor de empreendedorismo do Insper Marcelo Nakagawa.
Segundo ele, negócios que não suprem necessidades específicas não se sustentam. “Que problema um cupcake resolve?”, questiona.
Para Nakagawa, o interessado em abrir um negócio também deve estudar muito e fazer um planejamento detalhado.
“Cada vez mais é um terreno para profissionais. Às vezes as pessoas estão desempregadas e veem isso como uma tábua de salvação, mas não é assim.”
O professor indica os cursos do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) sobre empreendedorismo e aulas online para começar a entender o planejamento de cada setor. E destaca a importância de conversar com empresários da mesma área, até para entender o dia a dia do trabalho.
Se não estiver disposto a dar esses passos, tire a ideia da cabeça, aconselha Nakagawa.
“Você pode perder o dinheiro que juntou. Não é uma decisão para ser tomada no desespero.”
Ganhar menos?
O dinheiro está curto e é preciso voltar a trabalhar o quanto antes? Então deixe as pessoas saberem que você está disponível.
A dica é da professora Tania Casado, coordenadora do Escritório de Desenvolvimento de Carreira da USP.
Ela diz que procurar conhecidos de vários círculos é uma das melhores formas de encontrar vagas.
“As pessoas têm dificuldade de pedir uma oportunidade. Se fico desempregado, vou procurar todo mundo que conheço. Como você vai receber uma oferta se não sabem que você está desempregado?”
Casado alerta sobre as empresas de recolocação profissional, que podem queimar o candidato ao disparar centenas de currículos sem critério aparente.
“Antes de contratar, faça uma reunião para saber exatamente o que elas vão fazer.”
Ao buscar trabalho, orienta Joel Dutra, professor da FIA (Fundação Instituto de Administração), escolha funções mais desafiadoras, mesmo que paguem menos.
Se inscrever para um cargo parecido, mas inferior ao que você exercia, pode pegar mal no seu currículo.
Segundo Dutra, parece que você retrocedeu e depois vai precisar recuperar esse patamar. Por outro lado, escolher um posto em um outro setor é mais desafiador e oferece uma experiência diferente.
“Algo que te exige muito menos gera frustração e não agrega (conhecimento).”
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